terça-feira, 15 de outubro de 2013

Limpeza lírica

Venha até mim humildade
antes que eu passe da idade
de aprender a renascer
e deixe de renunciar à arrogância,
caia nos venenosos véus da ganância
e morra por dentro
por querer esbanjar pelo peito
pseudo-conhecimento e nenhum respeito.

Venha e me impeça de esbravejar,
impeça de esbanjar e ostentar,
e se assim, num barril, como um cão, continue eu a ladrar,
será esse - com lirismo in praxis - o meu lar doce lar.

Venha e me deixe libertar o instinto animal,
suspender as lodosas e imponentes construções de viver em meio social,
para que nunca desatente do lado espiritual
que no fim religa em legião

o que a filosofia e a religião
não encontram de ponto de encontro entre o vários e nulos Eu.

Zagreu!
       Espalhei os olhos que me guiavam por arrogância,
       para falar bonito, me mostrar com petulância,
       e durante a limpeza, vem a relutância,
       esta que me faz retomar em última instância:

É minha a ação! É meu o pensamento!
Mas não posso, mesmo quando - prepotente - tento.
Não posso guiar as energias do mundo!

Tomei posse de minhas ações!
Tomei posse de meu pensamento!
Mas não são minhas as razões
que fazem ser tão prazeroso o contato com o vento.

Valei-me Deus! Alá! Krishna e Tupã!
Obrigado - pela chuva - pela briga e pela bela comunhão; Xangô e Iansã.
Façam todos a mim ter a noção nada profana
de me redimir perante a natureza e perante a cultura humana.

Pois foi pedante querer ser o simulacro do mundo
e se desperdicei - no acidente ou no destino - a guia de sentimento sincero,
sei que o quê que eu espero
só é beber mais da água do amor, da humildade e da esperança,
para que através do atabaque o espírito guie a dança
da vida vivida aqui e agora mas também com o prazer e a dor da lembrança.

Afogue e esquente,
refogue e apimente
a mocidade,
para que não se recolha na maldade
e finalmente cante na chuva, ocupando a cidade.

Afogue o lixo e os coitados,
seja inimiga dos homens-transito alienados,
mas por favor não me negue o recado

de que naquela epifania teria eu amado ou injuriado.
Sábia são vocês, Iansã e Nanã, que na chuva e na lama,
não tenham dispensado,
que a injúria e o amor, ambas à beira da cama,
são o mesmo em substância: Vínculo único, oposto e ainda assim misturado.

Oxalá! Humildade!
para que eu voe desse momento em que cismo...
Voe por cima, mas não ignore o abismo
e me redima de uma vez do pecado do intelectualismo.

Epa Hei, rainha chuvosa!
(mistérios dionisíacos implícitos, não minto)
Kaô Kabecilé, justiça vistosa!
(Amo, erro, vivo e sinto)

E como sinto...


João Gabriel Souza Gois, 23 de setembro de 2013

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