quarta-feira, 23 de outubro de 2013

Jazz frio. Quase azul.

Quando não sou carrasco do que sinto,
sou carrasco quando minto.

Foi no fingimento,
que deveras senti aquele alento,
e dele não deixei espalhar
o que tanto forçava em mim mesmo para me apaixonar.

Sou carrasco por ter despertado sentimento
em alguém, 
e cansado do mesmo vício de me ver aquém
sendo reproduzido por outrém,
foi no chacoalhar da maré do amor
- esse eterno vai e vem -
que propiciei dor
e por outro alguém me apaixonei.


Fujo mais uma vez dessa realidade!
Fujo, Ogum não me vê, ele não olha os covardes!
Fujo para o lirismo, no existencial.
Fujo para o anarquismo, melhor epifania para convívio social.

Sim, o lirismo implícito na anarquia e na auto-gestão,
que dão, à beira da janela, mais de um exemplo,
e assim, me refugiando na canção e no meu indígno templo,
me procuro em quem não me quer, e deixo outro coração na mão.

Não teria eu enfrentado para depois fugir,
se não soubesse que um dia, poderia eu te atingir,
mas esse Cool Jazz, esse samba de baixa cadência,
me fazem olhar para mim mesmo e desconstruir a indecência
que construí para projetar que me refiz, 
e em verdade repetir a fluência
de sempre correr do amor.

Esse desastre que me tornei,
só o trumpete consegue revelar,
Ah! Vontade insubmissa,
que faça do impossível a primeira premissa realista,
do poder jovem e das velhas madames da pista,
para que a cooperação não seja só tema de revista
e ela persista
inclusive em meu livre amor,
porque assim, gerando gratuita dor,
me vejo e sinto asco,
me reconstituí em exercício só para virar carrasco?

Quase azul, quase triste,
Mas tem uma parte em mim que é sempre verdade,
e de onde essa fuga para torpes sorrisos e falsas vaidades
vai me levar?

No fim, responsabilidade em vários termos consegui,
e percebi que não interessa onde e quando acaba o mar,
foi assim que bem prossegui,
e não desisto de tentar te conquistar,
se fujo agora, veja bem, meu bem,
é para esperar a maré baixar,
a poeira assentar no chão,
e a rua, a cidade: todas embriagadas com canção
farão emergir o popular em ação,
talvez não para tirar político ladrão
ou fazer o que os modernos chamavam de revolução,
mas para dançar em chuva de verão
e renunciar o cinza, ou o monstro no rosto da multidão,
e vermos todos amando com tal zelo, e sempre, e tanto
que mesmo escondendo minha cara em seus curtos cabelos,
possamos nos sentir gente, longe de toda a humilhação
descabida
que essa mercadoria livre chamada vida
é para a conjuntura dos homens de poder.

E o pior, é que depois de girar,
olhar os prédios, a garoa e enfim cantar,
minha fuga só vai cessar,
quando, junto à compaixão mundana,
junto à evolução social e cultural humana,
seu omisso olhar finalmente me encontrar.

E então,
talvez só em utopia,
com pitadas de rebeldia,
sua boca me encontre finalmente
para que possamos nos amar.
E se não,
se for só viagem de juventude,
com pitadas de plebe rude,
Iemanjá me afogará novamente
nas salgadas lágrimas de mar.

João Gabriel Souza Gois, 23 de outubro de 2013





Obs:

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