segunda-feira, 30 de julho de 2012

Aos poucos

Escrevo aos poucos que já sentiram dor com poesia.
Aos poucos que acreditam na paixão antiga.
Aos poucos que se permitem chorar de felicidade.
Aos poucos que se permearam no viver mas carregam como combustível a infância.
Aos poucos que pararam para esperar uma onda no mar da constância.
Aos poucos que se sentiram loucos por fazerem pouco.
Aos poucos que ficaram roucos depois de sentir muito.


Aos poucos escrevo e moldo um conforto,
Aos poucos disperso e aborto convicções.
Aos poucos neguei origens impossíveis de serem negadas.
Aos poucos o que era forte ficou maleável.
Aos poucos o muito era remediável.
Aos poucos o barulho era insuportável.
Aos poucos a vida tinha pouco valor.


Com o pouco que aos poucos almejei,
Muito pouco procurei.
O desconforto e a paz do Amém
viraram significado de qualquer dizer de outrém.


Aos poucos pretendo recuperar o que foi perdido.
Aos poucos reconheço que o amor está difundido por todos.
Aos poucos o muito poderá ser dividido pelo futuro.
Aos poucos uma criança vira um homem, e já não tem medo do escuro.


Aos muitos significados que qualquer palavra pode trazer
a cabeças diferentes,
desfiro cobranças no passado.

Aos poucos significados que levam ao fim uma mente.
Aos poucos tratados traçados de maneira inteligente.
Aos poucos fadados e nem por isso evidentes.


Aos poucos que se reconhecem como muito,
Aos muitos que pouco creram em seu intuito,
a todos estes guardo um zelo de minha confusão,
para mais um dia respirar a calma e sentir menos dor sem razão.


Ao dia que um dia fluirá iluminado.
Vejo muito para ter me animado.
À noite que carrega alguns segredos,
Vejo pouco motivo para tantos medos.


Aos poucos as poesias ficaram pobres.
Aos poucos restou o dia-a-dia vazio do nobre.
Aos muitos motivos pelos quais nunca se descobre,
Aos muitos sentidos que criam defesas para o que o sentir encobre.


Afinal o meu desejo não passava do mesmo que o do outro.
O que almejo de alguma maneira almejam os outros,
mas os caminhos estão tão cruzados e cheios de vultos
que o não-falar vira uma defesa contra o insulto.


Que haja força,
força essa que aos poucos traga beleza,
a áurea própria,
a mente imprópria,
para que da auto-exclusão automática,
percorra o caminho 
da tristeza saudável até a sintomática,
para um prosseguir menos rígido.


Aos muitos amores que se encontram e se perdem,
Aos muitos senhores que ensinaram e hoje perecem,
Aos muitos falares que soam como prece,
Aos muitos andares do espiríto que cresce.


Aos poucos tudo isso virou um fado.
Um fado de peso insuportável.
Aos poucos elimino as mais fulminantes impurezas,
recupero certezas,
e me concentro.


Sem centro, sem cetro.
Sem tempo, discreto.

E esse tabaco hoje
já foi moeda ontem.
E essa solução de ontem,
é um problema pro hoje.

As muitas teorias assustam pouco.
As poucas práticas assustam muito.
Tudo isso alimentou um freio

na Roda viva.

Sorria,

você é alguém amado.
Cronos não te comeu,
só deu uma mordida.
E algumas mordidas

trazem lembranças,
algumas cobranças...

E o vale da esperança
nunca se inunda,

independentemente da insegurança e incerteza
da cabeça de quem afunda
na auto-avaliação.

Não há fundo que não deixe visível a superfície.
Respirar, enfim.

Sabotando versos populares:
'A luz no fim do túnel é o futuro.'


João Gabriel Souza Gois, 27/07/2012

segunda-feira, 2 de julho de 2012

Mais uma vez Drummond comigo.

Ser

O filho que não fiz
hoje seria homem.
Ele corre na brisa,

sem carne, sem nome.

Às vezes o encontro
num encontro de nuvem.
Apoia em meu ombro
seu ombro nenhum.

Interrogo meu filho

objeto de ar:
em que gruta ou concha
quedas abstrato?

Lá onde eu jazia,
responde-me o hálito,
não me percebeste
contudo chamava-te

como ainda te chamo
(além, além do amor)
onde nada, tudo
aspira a criar-se.

O filho que não fiz,
faz-se por si mesmo.


Carlos Drummond de Andrade.

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Sentimentos meus.

Do ideal fosco à prática morta,
Do ideal sólido à prática apaixonada
Só isso e além disso nada.

Humano morto pelo animal que matou.
Animal morto pelo humano que negou.
Vivo, afinal.

Tudo diferente nesse pequeno mundo,

tudo gigante nesse universo,
disse que não escreveria nenhum verso,
mas recobrou o pensar acalmado
e regurgitou na mente
que Maniqueísmo é algo limitado

como a vida.
Acalmar a bagunça dos sete mares
(compreensão acalma o oceano interno)

ou das sete cabeças do bicho conspiratório.
Que afagou um sentimento ilusório

para finalmente dar velório
e ver no simplório
beleza,
e no conforto destreza.

Labirinto Kafkaniano

pode aparecer todo ano,
mas a realidade
não está em livros.

Viu em Hegel utilidade,
(Indgnai-vos!)

no pai do utilitarismo o péssimo,
em Schopenhauer a identificação,
em si uma vontade maior.
Na radicalização o erro.
em algum lugar uma crise de bezerro,

(como Descartes talvez diria,
mas lhe faltou poesia)
Em Deus nada.
Another one, never the last.
Brick for me, before I forget.
Do ótimo ao péssimo,
do péssimo ao ótimo
a vida é a mesma.
Em si e no mundo:
Um subjetivo romântico

que ignora a diferença entre visão plena
(que não há, só em Deus que é fada)
e o ver quântico.
Um objetivo realista,

que passou do rótulo de pessimista
a uma necessidade.

Simplicidade enriquecedora,

Complexidade ensurdecedora,
Complexidade completa,
Simplicidade discreta.


João Gabriel Souza Gois, 02/07/2012

Drummond, mais uma vez.

   Venho por meio deste - depois de na ultima postagem ter mencionado uma fase que se encerra - clamar a Drummond novamente, em uma hora diferente do cansaço.

Versos à boca da noite.

“Sinto que o tempo sobre mim abate
sua mão pesada. Rugas, dentes, calva...
Uma aceitação maior de tudo,
e o medo de novas descobertas.


Escreverei sonetos de madureza ?
Darei aos outros a ilusão de calma?
Serei sempre louco? sempre mentiroso ?
Acreditarei em mitos ? Zombarei do mundo ?


Há muito suspeitei o velho em mim.
Ainda criança, já me atormentava.
Hoje estou só. Nenhum menino salta
de minha vida, para restaurá-la.


Mas se eu pudesse recomeçar o dia !
Usar de novo minha adoração,
meu grito, minha fome... Vejo tudo
impossível e nítido, no espaço.


Lá onde não chegou minha ironia,
entre ídolos de rosto carregado,
ficaste, explicação de minha vida,
como os objetos perdidos na rua.


As experiências se multiplicaram:
viagens, furtos, altas solidões,
o desespero, agora cristal frio,
a melancolia, amada e repelida,


e tanta indecisão entre dois mares,
entre duas mulheres, duas roupas.
Toda essa mão para fazer um gesto
que de tão frágil nunca se modela,


e fica inerte, zona de desejo
selada por arbustos agressivos.
(Um homem se contempla sem amor,
se despe sem qualquer curiosidade.)


Mas vêm o tempo e a idéia de passado
visitar-te na curva de um jardim.
Vem a recordação, e te penetra
dentro de um cinema, subitamente.


E as memórias escorrem do pescoço,
do paletó, da guerra, do arco-íris;
enroscam-se no sono e te perseguem,
à busca de pupila que as reflita.


E depois das memórias vem o tempo
trazer novo sortimento de memórias,
até que, fatigado, te recuses
e não saibas se a vida é ou foi.


Esta casa, que miras de passagem,
estará no Acre ? na Argentina ? em ti ?
que palavra escutaste, e onde, quando ?
seria indiferente ou solidária ?


Um pedaço de ti rompe a neblina,
voa talvez para a Bahia e deixa
outros pedaços, dissolvidos no atlas,
em País-do-riso e em tua ama preta.


Que confusão de coisas ao crepúsculo !
Que riqueza ! sem préstimo, é verdade.
Bom seria captá-las e compô-las
num todo sábio, posto que sensível:


uma ordem, uma luz, uma alegria
baixando sobre o peito despojado.
E já não era o furor dos vinte anos
nem a renúncia às coisas que elegeu,


mas a penetração no lenho dócil,
um mergulho em piscina, sem esforço,
um achado sem dor, uma fusão,
tal uma inteligência do universo


comprada em sal, em rugas e cabelo.”


Carlos Drummond de Andrade, 1962


.Reciclo ...


"Quando o homem inventou a roda
logo Deus inventou o Freio,
um dia um feio inventou a moda
e toda a roda amou o feio"
               Piercing, Zeca Baleiro.




Existirá culpa!
e como existirá...
Existirá quando não
consegue imaginar
o que poderia ser entendido
de um verso perdido,
de um grito disperso,
de um ímpeto perverso
de um querer corrompido.


Não existiu nada senão o Freio.
O Cupido que conheci usava uma espada de fogo,
encarava a fé como um jogo,
onde qualquer outra coisa em vão
era um decreto discreto
mas que doía
como dói
a cabeça
quando se corrói
o que impõe que esqueça
e o que quer lembrar.


O limite da História
é memória
do historiador que foi notado,
coitado...
existem outros.
O pouco que cada um é dotado
pode virar muito
se for regado
com Amor.


Se livrar de uma dor.
Pedir liberdade ao ardor.
Tudo quanto não pode culpar.
Pediu?
Não pediu.


Há nos pensamentos,
lamentos,
mais uns quantos lamentos
para se lembrar do que gosta.
Do que gosta em seu próprio gosto.


O navio
perto da costa
desencosta e segue.
Uma várzea
cheia de mágoa
enche de água
os olhos de poucos.
Não há navios

que saiam de várzeas...


Um Freio sem roda,
tornou o mundo feio

com um pouco do que pouco incomoda.


Cabeças,
existem várias a pensar por aí,
não seria possível interrogar e pedir
que saíssem delas a verdade.

Descobrindo

que a vontade
é capacidade
de...


Freio.
Foi feito por um Deus de muitos
e ninguém contesta.
Mas encarar o mundo por uma fresta
enruga a testa
quando sabe que ele é maior.
Atrito.
Pior...


Não foi e não será
mas precisará
acionar o freio na descida
descontrolada.
Mesmo que o cheiro de borracha
fique insuportável.
Seria confiável?
Que pergunta improdutiva.
Seria duvidável?
Que fajuta rebeldia.
Seria ponderável?

Que melodia sem harmonia.
Seria adorável?
Seria, foi, será e é.


Até mais,
Até mais quis,
até menos pediu.
Até onde pôde chegar
o pensar carregado
de pesar acumulado
do corpo desorientado
por falta?


Quando só se vê
falta,
aciona o freio
e o anseio
será bem vindo,
mesmo vindo
indo, voltando
e esperando para ficar
sem lembrar que pode ser
depois de ignorar que não foi
dispôs
um projeto
que não soou reto
mas que agradava na força
do gosto
que moldava a curva.

Centrípeta


Centro, onde está?
Não existira
em um pequeno universo
onde o verso
vira lei.
Cabeça pequena.
Nada nobre.

Seria pobre

uma pequena praça
que pode carregar
uma sabedoria milenar?
"No universo da cultura
o centro está em toda parte"
Não há infarte
no concordar.

Uma pequena desgraça

abandonou o pensar.
Postura,
Me centro.
Concentro,
disperso
e vem mais um verso
em vez de produção.


Freio no verso,
para que o controverso
e inimigo do objetivo
seja deixado de lado
sem tentativa de corretivo.
Penso Tenso,
Tenciono o pensar,
cuspo o pesar
e volto a pensar
que tentar outra vez
não será perda.


Perdido.
Desiludido
pela própria sensibilidade
de encarar com integridade
o que foi solto.
De encarar como ingenuidade
o que faltou pouco.


Freio.
Atrito.
Calor.
Ardor.
Freio.
Anseio.
Freio.
Vazio.
Cheio.


Meio cheio, ultimamente.
Meio vazio, contidamente.
Um quarto. Mais nada.
Um oitavo. Menos ainda.
Rumando o zero.
Mas eu quero,
rumar o infinito.
Atrito.
Calor.
Sorriso.
Amor.
Freio.
Centro.


De dentro pra fora.
De fora: tormento,
momento,
agora,
lá fora:
sentimento,
aqui dentro demora,
lá fora tudo lento,
tudo dentro justo agora.


Tudo fora mais lamento.

.
..
...
....
.....
....
...
..
.

Espelho apenas.
Ponto final é a morte.
Não há falta de sorte

como não há almoço de
graça.

Desgraça 
para gracejar
a graça de continuar.

João Gabriel Souza Gois, 01/07/2012

Obs: Até poesia precisa de férias.
Eu preciso de férias pra encarar vestibular de novo.

Essa fase de poesias existenciais pretendo encerrar por aqui, com ".Reciclo...",

do péssimo ao ótimo a vida é a mesma.