domingo, 17 de novembro de 2013

Tolopatia platônica (diálogo entre um; monólogo entre dois)

Sente aqui, tome um drinque.
Há muito o que se falar, e sempre o relevante é ignorado.
Só te chamei para ter alguém ao lado,
não precisa temer meu olhar,
nem tremer ou palpitar,
caso o que eu talvez represente
te atormente.

Isso, acenda um cigarro,
me conte mais sobre aquele plano bizarro,
e também do tédio que não aguentamos mais sozinhos;
não precisa me amar, nem seguir meus caminhos,
também não precisa esbravejar ou fugir de meus carinhos.

Se toco e faço música
é para agradar e não para soar desafinado,
e se dedilhei bem no momento errado,
nossa sinfonia perdeu a harmonia
e nesse barulho embaralhado,
meu coração badalado de tensão
pede resolução.
Se soou no tom errado,
peço meu sincero perdão.

Amor, nossos olhares,
nosso nulo afago,
nosso ninho de ar,
nossa brasa que não vira cinza, mas também não queima,
nossa possível consideração de um sim,
nossa certeza imanente de não,
tudo isso, vai e vem,
balança, machuca e me alegra,
me traz e leva a ternura,
porque nessa instabilidade há a aventura
que vejo seus receios te forçarem a esquivar.

Encoste aí, tire os sapatos,
não repare se de vez em quando te olho e me sinto fraco,
é só pela incerteza, só por não ver fluir...
Até agora só conversamos no silêncio,
te amei só daqui,
e desculpe se sou poeta e fingidor,
se clamo tanto, em desmedido peso, a aventura do amor,
se ressalto e reconheço, sem medo e com petulância, o desgosto que for,
mas percebo, que sendo eu o fugitivo e arisco,
para não te abalar e não incomodar, quando arrisco,
soei covarde...
Já sabes o que em mim arde.
Entenda que eu, premeditando o final,
não me conformei e vi espaço,
não para desconcertá-la em embaraço,
mas para livrá-la do que a prende,
e permitir aquilo que o suor revela quando o corpo transcende,
e deixar, livremente, esquentar o que tende
a morrer de desamor.

Sinta-se em casa, aceita um petisco?
Sei que esse assunto pareceu descabido,
nem comecei a dizer, só sorri, desviei o olhar...
Me apeguei no vínculo das vontades,
e senti você tão bem,
a gostar também...
E então lembro-me que para as vaidades
só existe um fim que soe bem
pra mim:
O desapego, sim...
preciso da lucidez que ele presenteia,
porque apesar de apaixonado, idealista e romântico-tolo rapaz,
sou também agente rebelde e violento da paz,
sou também realista e pessimista quando incapaz,
e se percebo que não posso roubar o sabor que seu lábio traz,
me acorrento em desejo, na vontade que incendeia,
percorro o lirismo, fujo pros bares e pro sacolejo,
minto verdades, saboreando outros beijos,
e ao passo que corro de ti,
mais te confesso o que desdisse até aqui,
o que insinuei, mas não consegui insistir.
O que está na ponta da língua,
e a cabeça não a deixa exprimir...

Esse papo todo te cansou? É, eu vi...
sabes muito bem que se quiser dormir,
minha cama é nossa cama, meu calor é só pra ti,
e não te assustes se acha que cobrirei com meu edredom
tudo o que teu jovem anseio quer e não posso dar,
amamos e burramos, não posso negar,
mas prender deusas livres não é meu dom,
só saibas que se estás perdidas nas ondas de som,
posso ajeitar o tom, em melodia nos propagar,
e explodir em um dia o que só melhora o entorno,
e celebrar por não ter deixado nosso calor morrer de morno.

Desculpe, falei demais sem nada dizer,
Era isso, conversa gasosa, vinda da idealização, do estúpido que sou,
seus olhares, sua fala simpática, tudo isso me enfeitiçou...
E não posso feri-la só porque não a posso ter.

Isso era o que estava aqui reprimido,
sei, pra uma conversa com os olhos e ânimos,
pra um diálogo de expressões e pânicos,
pareceu demais,
mas se eu não meditasse,
não fosse eu lírico, tu impasse,
não haveria nada que limpasse
meu desejo senão teu calor.

É assim que falo tanto com teu olhar,
entendeu, amor?
Nos deixarei descansar,
amanhã estarei sem você e cheio de labor.

Juro a ti, insinuei o evidente, não fui irônico...
Só isso que tenho a não-dizer, como tolopata platônico.


João Gabriel Souza Gois, 17 de novembro de 2013.

OBS:

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