sexta-feira, 20 de setembro de 2013

À filha do mundo

Ando meio atrasado com o que não ligo,
mas ainda assim vejo no aleatório um descompasso comigo,

e, o que sempre me fez lento, calmo, reflexivo,
me deixou a parte, leso, diminutivo.

O que será que há no espírito
que mesmo quando se sabendo organizado,

rasurando e mensurando cada significado,
ainda insiste no que sabe que não o alimenta?

É assim, que mesmo acelerada a mente,

as palavras saem lentas,
pois a legitimidade do que se diz,
não concorda com o direito de imaginar no que se pensa.

Há, no fundo de tudo, uma cabeça densa,

que flui menos categoricamente,
quando os cantos, discursos e o entorno do ambiente,
confluem numa convivência mais calorosa e menos tensa.

A pós modernidade, e seu camelo querendo ser leão.
A foz irreconhecível da infalivelmente errônea especulação.
Atroz rimas de covarde, que já se sentindo com a devida benção

ainda se topa, no meio das pedras do caminho e dos paus esculpidos
em forma de cara (nos rostos vizinhos) com a auto-depreciação.

Se diminui, não necessariamente por opção,

mas enfim, não quer ser Deus,
quer conhecimento por sua natureza,
quer sorrisos, para fluir sem medo na correnteza,
quer menos jaulas da civilização e mais carícia às tigresas,
mas a antropocêntrica mania de frear, com a Moral-represa,

o rio lindo dos encontros e desencontros da humanidade
me fazem voltar a mim culpa, veneno dos fracos, e não responsabilidade.

Saibam que daqui, com minha pequena canoa chamada individualidade,
já observei vários cenários da vida agitada de mar em instabilidade,

e só absorvo tanto da metáfora da maritimidade,
quando não consigo diferenciar o refúgio lírico de uma tempestade.

Mais que espelho, crio vozes que em mim ainda estavam retidas,

e, em meio às imagens e significações, lembro de trechos da vida,
sempre permeio, nas vertiginosas e embriagadas neblinas,
um momento cinza, e mais tarde, um de "Terra a vista" (cheia de árvores floridas).

E quando me topo, como ser do Tempo, mas também como Eu.
Quando me reconheço em uma dupla ontologia de Ser e Devir.
Quando extraio o que posso de Nietzsche, mas também de Hegel,
de Sartre e de Schopenhauer,
ainda assim, em meio as meras e pequenas banalidades,
me engano com uma necessidade,

e fico à deriva.

Nem se sabe mais se falo do Rio, do Mar, da Chuva ou dos Aquíferos.
Sou tão água, que não nacionalizo fonte, não classifico cientificamente seu tipo.
Sou tão não e ao mesmo tempo sim: um moderno líquido, pós moderno mórbido-vívido,
que nessas fúnebres ressacas de mar agitado,
 e nas outras correntes de mudança de rio calmo e habitado,
percebo que o grande hiato entre mim e minha arte
na verdade só existe
pela velha concepção que persiste,
pois o vazio do ser materialista e historicamente egocentrado,
se revela entre ele e o próximo numa distância tão grande de mentes

e tão pequena de espaço,
que a cada passo no chão cinza,
minha alma que já viu cor,
se lembra apenas do que quis por

como prioridade,
e eu não sei se por meninice, 
ou por desonestidade,
me agarro num galho das margens,
paro um pouco, olho as paisagens,
e derrubo um pouco de mim em palavras,
vejo nos poemas minhas pequenas larvas
e não consigo dissociar em palavras de distinção,
o viver, o criar, o pensar, o querer e a arte em ação.

É tudo tão eu!
Mas nada disso é meu.
Preencho minha individualidade,

mas presto serviço à humanidade.
Seja na canção alegre e salobra do ridente,
ou no alto-mar do olhar perdido do ainda vivo moribundo,
a arte sai de um ser e de um tempo presente,
e mal foi concebida, já é filha do mundo.

João Gabriel Souza Gois, 20 de setembro de 2013

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