terça-feira, 25 de junho de 2013

Vontade libertária

Usava botas de couro e olhares de Abate,
Calçava o segredo trágico dos coros e o sabor do deus Marte.

E eu, no deleite de boi abatido,
ferido

e finalmente livre,
fiz do olhar curioso
o limite de meu gozo

e fosco, fraco
me fortaleci em sua clara e silenciosa renúncia de mim.

Ah, meu amor efêmero mais eterno dos
                                              [que os fingidos poemas românticos
Fiz da contemplação platônica um impedimento do vir-a-ser da dor.

Sou eu um ridículo poeta fingidor,

pois para o cerne metafísico das coisas, da dor primordial,
tento embriagar de devir imagens estáticas e estacionárias da poesia.

E o que será que não é fingido?
No âmago caótico do universo sou um pequeno universo quântico.
No interior oculto das existências e coisas, só enxergo imagens aparentes.

Sim, apesar de outro, sou o mesmo do amor penitente.
Sou o intolerante pregador da tolerância.
Sou todo o paradoxo e incoerência da razão pura de mim mesmo.

E que saudade de me jogar a esmo!
De renunciar dessa condição de indivíduo!
Mas não mais me divido!
Não corrompo mais almas na união delas com a minha.

Encontrei o ideal estético de Schopenhauer,
Renunciei a vontade e contemplei a obra de arte pura e natural que és,

Óh! Divina semideusa transeunte aleatória!

E dessa contemplação me pego cultuando a imagem do que és!
Contemplo sua apolínea e onírica redenção na aparência,
nessa condição de platônico atônito,

mas não ouço a música que há em ti...

Não posso ouvir o ditirâmbico pulsar de seu cerne existencial,
não posso conhecer-te,
não posso me metamorfar, nem atingir nenhum êxtase dionisíaco contigo...

Só estou cá comigo,
contentando-me com o couro que aparenta sobre átrios e sob Animá.
Contemplando a verdadeira estética burguesa e moderna:
mas sem o calor revolucionário dos povos,

sem a selvageria lírica da natureza titânica,
sem a sabedoria singela dos anciões agrários...

E o fingidor que sou cansou-se, entende?
De consolo metafísico sem amor,
de versos perdidos de dor...

Quer não mais a verdade mentirosa
- a da moral e aparência; a do padrão estético e funções seno -
mas uma mentira saborosa,

como a que esconde por trás dessa onírica presença imponente...
Mentira esta, que nunca cairá...
Que se revelará com outras dessas mentiras,

fazendo de ti, outra, para que outra não seja necessário.

Quero a mentira de quem goza ser o otário

que perdura e perdoa
pois sabe que além do princípio de individuação
(e sua metáfora da canoa)
o seu pequeno universo de abatedora

trará uma dor arrebatadora
da qual não renuncio,
mas inicio uma nova carreira de devir
que me sacudirá tanto de ir e vir
me dando paz ao intuir:

Contigo eu seria preso a algo além da estética beleza:
O ser mais livre da titânica natureza!


João Gabriel Souza Gois, 03 de junho de 2013

Obs: "Como é bom poder tocar um instrumento..."
                       

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