sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

O Último Dia (Exercício da Compaixão)

Será que nesse em que todos falam,
sentiria eu seus lábios molhados?
Choraria novamente em seus braços?


Sentiria mais uma vez aquela
dor em conjunto,
de crise,
de precupação constante
de poder, a qualquer instante,
sofrer o deslize
e deixar de estar junto.
Que venha a sequela!


Sequela de amor intenso
e que se foi.
Seria aquela dor, o imenso
desprazer que corrói
a vontade de continuar
a procurar,
em qualquer lugar,
algum abrigo
que traga o perigo
e a instabilidade
de volta a vida?


Será que nesse em que todos falam
sentiria eu lábios molhados de algum amor?
Ou choraria em conjunto, o medo e a dor
de estar próximo do fim?


Então é assim.
Assim é,
não sinto falta de sua carne,
nem de seu cheiro,
nem de seu gosto,
nem de seu nome.


Sinto falta sim,
do que é
o sentimento mútuo, e o alarme
do medo de se perder inteiro
por perder o posto
que tem mais renome.


Esse alto cargo,
de rapaz enamorado,
que se preocupa
e por alguém é preocupado...
Traz gosto de medo e tira o amargo.


Da estabilidade e do prazer esporádico
sou agradecido,
por me fazer perceber que diante do fático
prazer concebido,
estou insatisfeito,
pois gozo e nada sinto no peito.
Grito prazer em apenas um instante,
e nem lembro, quando distante,
do calor que senti.


Será que nesse dia em que todos falam,
consiguiria eu fazer algo além de escrever e amar?
Terei fé em algo e pararei de duvidar?


Isso nem Deus sabe...
Pois se eu não o conheço
ele não me conhece,
e mesmo que eu suspirasse uma prece,
ninguém ouviria.


Nem o Amor
nem Deus.
Ninguém.


Será que nesse dia em que todos falam,
viveria eu o infortúnio e triste episódio
de morrer sozinho?
E ver todos os vizinhos
a chorar uns pelos outros,
sentindo-me o Sonhador de Petesburgo.
Sentindo-me a barata do mundo,
Condenado a um processo bizarro,
que jamais combaterei por estar cego.


Serei eu a morte que sofre o infortúnio
de não poder matar, sem saber o porquê?
Que resolve amar sem saber como!?
Serei eu a única existência do universo, que enxerga apenas ilusões?
Serei eu!?


Acho que exagerei, como sempre faço,
pois desmancho em prantos por ser fraco.


Egoísta eu-lírico de que abuso sem pensar,
terás tu nas palavras grafadas, alguma resposta?
Pois essa vida indisposta
de barata, sonhador, cego, marginalizado, herói,
condenado, gauche, amigo ou playboy
só me faz pensar no dia.


Nesse dia em que todos falam
e que nunca presenciarão,
pois o fim será individual
como as coisas no mundo são.


Morrem sempre, um a um e tanto!
Que não há água em Deus pra tanto pranto!
Tristeza no morrer só há
se não houver alguém que por ti há de chorar.


Antes de voltar à terra,
nesse dia em que todos falam,
queria sentir no peito a aventura
do medo de perder o amor e a ternura
da mulher que se ama, seja ela quem for.
Essa que chorará no meu último dia.


Se acaso não houver ninguém,
que lembres de mim, por ter sido
o que ninguém mais pode ser:
De hoje ao seu morrer.


Se o fim for coletivo,
anuncio ao mundo,
que mesmo sem vê-los,
os amo de verdade e intensamente
da forma mais sincera.


Pois já que o fim se espera
poderei me abster de valores e moral
e oferecer minha alma como sacrifício
para praticar o exercício
mais digno que todos antes mencionados.
O exercício da compaixão, que não se restringe
só aos enamorados,
Mas a todos os humanos,
que serão fadados,
nesse dia em que todos falam,
a serem amantes.
Os amantes de João.

João Gabriel Souza Gois, 17/05/2011


OBS: É um poema bem antigo, visto que somos completamente outra pessoa com o passar de pouco tempo. Porém achei ele em algum lugar por aqui e resolvi postar. Ainda faz muito sentido, pois me lembro o porquê de escrevê-lo, e lembro do momento que vivia. Muita coisa mudou, muita mesmo, mas ainda assim, por conta de existirem outros poemas "Exercícios" escritos numa fase óbvia da minha vida, esse veio bem depois e finalizou a idéia. Acho difícil existirem outros... Esse é o ultimo dos "Exercícios", foi escrito em outra fase (diferente dos outros três), mas envolve a mesma coisa. Sim, eu sei que existe a música e sim, ela influenciou em alguma coisa. Ah! E postar em 2012 é mais legal, né não? Heim! Senhores Maias? hahaha =]

Um comentário:

  1. É um texto de marcas. Há marcas de estilo de artistas brilhantes (inclusive do responsável pelo poema em questão) e citações nas mais diversas formas durante todo o texto. Esse recurso traz, dentro de algumas linhas, bibliotecas de ideias, efeitos e sensações que estendem o texto para muito além do que foi escrito: tudo que pode ser lido.
    Chamam a atenção trechos que parecem extremamente elaborados em sua complexidade, mas que não podem ter surgido com menos espontaneidade que a de costume na naturalidade tão evidente durante o texto.
    O tema não poderia ser mais adequado. Se há algo a que devemos abrir debate, o dia. O dia de que haverá sempre mais a se dizer, em que se reserva, afinal, um tanto de ideias de uma vida que se expresse, que depois dela continue, ainda, ela.
    Aqui sim, em grande estilo, as ideias vieram ao papel entre os maiores referenciais de leitura, observação, reflexão e debate.

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