sábado, 30 de maio de 2015

Birdme

Fecham-se as cortinas.
Silenciam-se os espectadores.
E o camarim me oprime.

A solidão gerou o roteiro,
Mas não o prestígio.
E depois de gozar em público,
Me olho – frígido,
Me encolho – rígido,
e percebo: O camarim me oprime.

Longe dele, posso ensaiar romances,
Tergiversar instante,
compor momento.

Mas nele, cubo horrendo,
só vejo dentro: tudo aquilo que não cabe no mundo.

Minha melodia destoa a harmonia mundana,
E, entre a falsa rebeldia e a indecisão profana,
o palco é tudo que quero e tudo que não aguento mais,
porque depois, quando não mais somos semi-deuses, bacantes e animais,
voltamos à dialética, à vida burocrática, e tudo que em mim não cabe mais.

Esse negócio de querer ser poeta passarinho,
e ser lagarto escama dura, sozinho em cama dura,
me ofende.

Camarim... Por que obriga este espelho a me mostrar a mim?

O camarim tem uma cama.
Uma cama dura pra valer.
Você não dorme, só pensa.
Você não sonha, só vê.
O camarim que em mim ecoa
até acha boa
a ideia de uma caminhadura a se estender.
Caminhada científica, específica, mímica da mímica do perceber.

Mas esse caminho ordinário e sincero é corrompido
quando pelo palco já estou seduzido,
pois só nele faz sentido, de fingido,
realmente ser.

João Gabriel Souza Gois, 30 de maio de 2013

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