terça-feira, 26 de agosto de 2014

Indigestão

Comi o mundo.
De longe.
Mas comi.
Com os olhos
eu o engoli.
Cada canto, quero tudo.
Cada pranto! quero mudo...

Mas meu estômago,
jovem e doente,
preguiçoso e imprudente,
matuta em cada pedaço
do mundo
em cada possível e terno abraço
(dois mundos?)
reflexão desmedida,
refluxo, coisa prendida.
prendida.
perdida.
E puxa!
Força!
Não sabe se volta por onde veio,
ou sai por onde não quer.
Não sabe se o difícil é o anseio
ou a deterioração
do que, no instinto da dúvida
e do descobrimento,
meus olhos, com tanto fomento,
empurraram para dentro.

Meu estômago não sabe.
Meus olhos contemplam.
Meus braços balançam por desistirem de tentar alcançar.
Minhas pernas, entre o deleite do olhar
e o sofrimento do não digerir,
dançam sem consciência.

E minha boca canta sem paciência.
E meu cérebro flutua, sem ciência.
E o refluxo do espírito
me derrama fluência,
E a pele do corpo
me absorve influência.

Olhando tal situação,
com sua gulosa inocência,
meus olhos percebem,
antes de qualquer digestão do que vê,
que esse ritual marca a vida:
o movimento que o pensamento não digere,
a verdade que o raciocínio não sugere,
de uma simplicidade que filosofia nenhuma aspire.
Percebem o óbvio:
Viver é verbo.
Para começar, é simples, inspire.

Para que essa mistura de orgãos
desconexos que sustentam ideias não se esqueça,
basta que se escreva, antes de digerir o que sente...
Aprendemos a inspirar a primeira vez chorando - literalmente.


João Gabriel Souza Gois, 26 de agosto de 2014

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