Aqui estou sem mim.
Agora sei como fazer o que devo,
e como dever o que não faço mas não vivo sem.
Veja bem,
não me leve a mal,
Já começo justificando
E opondo açúcar e sal
em dicotomia
para dizer com uma sinceridade
de quem se reconhece em sua própria demagogia:
A arte virou um discurso.
Esta sempre em mim, a acaricio mas não crio intimidade.
A política virou um discurso.
Está sempre em nós, mas em mim não encarna de verdade.
A verdade virou uma distância,
daquelas medidas com números imaginários, onde cada estimativa
não tem ponto para se perder.
Eu virei um discurso distante,
E você, um já pronto, facilmente crível,
passivo e passível
de ser reproduzido pra mim mesmo,
para não mentir, me consolando, o que cada nova paixão
nunca foi como foi o que conheço por amor.
Até o espírito!
Esse que só enxergo em arquétipos culturais,
em situações intensas e carnais,
que se revela mais espirituoso quando sabe que é corpo também,
esse que com o carnaval se dá tão bem,
até o espírito virou um discurso, nem tão elaborado,
do que eu fiz ou falo para sentir abençoado.
Mas abençoado em retórica, não em dança.
Abençoado só por vagas horas, não nas lembranças.
E não é que até mesmo a verdade, que é distância imensurável e inacessível,
nesse mundo não dicotômico de se assumir si mesmo e não se suportar,
existe em convicção mas não em fato, e quando se apresenta contém
língua, palavra e convence sofismas na sedução do falar bem.
Até essa puta paga chamada verdade,
não nega a mentira incrustada em cada discurso que uso para acariciar meu comodismo.
Grito alto, amo vários e não amo nenhum,
Grito baixo, pois só ouço a mim e ninguém me ouve,
Filho, macho, e já definido por outras palavras e codinomes.
A lingua que me liberta no poema, me prende nos termos,
nas aparências.
Onde quero chegar?
Chego aqui,
e afirmo pra mim:
Hoje choveu em São Paulo.
Choveu esperança e perspectiva,
Vejo o caos criativo sair da palavra,
E, do jeito que emerge, sair à vida ativa.
Mas e em mim... Sou tão egoísta assim?
Em mim que não chove mais,
em mim que não queima,
em mim que demora,
em mim que tanto teima,
em mim que o tempo e os tijolos abstratos da linguagem
fazem comício,
permitem o hospício,
mas não permitem sequer uma dança.
Onde assim pode haver esperança?
Vivo, me sinto mais eu e menos nós.
Vivendo, em prol do eu, me perdi em nós.
Vivências no Sol, em Mim, de Ré e por algumas Dós
me limpam do que a linguagem vicia
mas não vejo onde se reinicia
o que eu fazia tão bem em momentos de epifania:
A Contemplação seguida de silêncio,
A sensação sem palavra, de se expandir, de se sentir imenso.
João Gabriel Souza Gois, 23 de maio de 2014
OBS: Contemplação
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